Meios de comunicação <br>e capitalismo em África

Carlos Lopes Pereira

O im­pe­ri­a­lismo está a for­ta­lecer o do­mínio eco­nó­mico sobre os meios de co­mu­ni­cação da África sub­sa­a­riana, acen­tu­ando assim a sua in­fluência ide­o­ló­gica sobre mi­lhões de afri­canos. Para esta es­tra­tégia con­tribui a con­so­li­dação de grupos me­diá­ticos em África li­gados a ne­gó­cios em di­fe­rentes áreas e as­so­ci­ados ao grande ca­pital in­ter­na­ci­onal. Esta si­tu­ação, que au­menta a con­cen­tração da pro­pri­e­dade e re­tira a in­de­pen­dência dos media pri­vados afri­canos, não tem im­pe­dido, antes fa­ci­li­tado, a cres­cente pe­ne­tração e in­fluência, a sul do Saara, dos po­ten­tados mun­diais da in­for­mação, em es­pe­cial norte-ame­ri­canos.

Um ar­tigo pu­bli­cado na Pu­e­blos – Re­vista de In­for­ma­ción y De­bate, pelo jor­na­lista e in­ves­ti­gador Se­bas­tián Ruiz, li­gado à Uni­ver­si­dade de Se­vilha, con­firma estas ten­dên­cias. O es­tudo aponta para uma in­dús­tria me­diá­tica sub­sa­a­riana que atra­vessa uma fase «vi­brante» e acom­panha o cres­ci­mento eco­nó­mico do con­ti­nente, onde o acesso às tec­no­lo­gias de in­for­mação con­tinua no en­tanto a ser «as­si­mé­trico» – de país para país e a nível in­terno de cada um dos países em função das de­si­gual­dades so­ciais que se têm agra­vado.

Dois si­nais tes­te­mu­nhos dessa pu­jança são os cerca de 200 pe­rió­dicos hoje exis­tentes na Re­pú­blica De­mo­crá­tica do Congo ou as cen­tenas de ar­dinas que moldam a pai­sagem ur­bana em Nai­robi, ven­dendo jor­nais em vá­rias lín­guas – do in­glês ao árabe, pas­sando pelo swaíli.

O ar­tigo «Os fios me­diá­ticos da África ao sul do Saara» re­vela a emer­gência de con­glo­me­rados me­diá­ticos no con­ti­nente e como, para me­lhor vender no­tí­cias, filmes, ví­deos, discos ou re­vistas, es­ta­be­lecem ali­anças co­mer­ciais com par­ceiros es­tran­geiros.

A sul-afri­cana Nas­pers, por exemplo, con­trola 23 re­vistas (in­cluindo as mais lidas da im­prensa cor-de-rosa), sete diá­rios e o gi­gante da te­le­visão por as­si­na­tura DSTV. Com mais de um sé­culo de exis­tência, esta mul­ti­na­ci­onal da África do Sul – que atra­vessou o re­gime apartheid e se adaptou aos novos tempos – vende ser­viços em mais de 130 países. In­cluindo o Brasil (onde é pro­pri­e­tária da in­flu­ente edi­tora Abril), a China (é as­so­ciada da Ten­cent, de ser­viços de In­ternet e te­le­mó­veis) e a Rússia (onde possui ac­ções na hol­ding DST, pro­pri­e­tária do portal de In­ternet Mail.ru).

No Quénia, o Na­tion Media Group (NMG), fun­dado há meio sé­culo, é o maior con­glo­me­rado da África Ori­ental e um dos mai­ores do con­ti­nente. Está pre­sente em te­le­vi­sões, rá­dios e jor­nais do Quénia, Tan­zânia, Uganda e Ru­anda. O seu maior ac­ci­o­nista é o Fundo Aga Khan para o De­sen­vol­vi­mento Eco­nó­mico, que por sua vez in­tegra a Rede de De­sen­vol­vi­mento Aga Khan, com sede em Ge­nebra. Esta es­tru­tura tem in­te­resses em 30 países de África, Ásia e Médio Ori­ente, em sec­tores que vão do meio am­bi­ente ao mi­cro­cré­dito, da saúde e edu­cação à cul­tura. Li­gada, claro, ao mul­ti­mi­li­o­nário líder dos xi­itas is­ma­e­litas.

 

Jor­nais, te­le­vi­sões,
Coca-Cola e bancos

Muito es­cla­re­cedor da forma, também na África sub­sa­a­riana, como o ca­pital de di­fe­rentes sec­tores eco­nó­micos pe­netra e con­trola os media, é o caso do IPP Media Group, da Tan­zânia. É pro­pri­e­tário de 10 jor­nais na­ci­o­nais, de duas das mais po­pu­lares es­ta­ções de te­le­visão leste-afri­canas e de uma de­zena de rá­dios. Ao mesmo tempo, é dono da Bo­nite Bot­tlers, o único en­gar­ra­fador de pro­dutos da Coca-Cola no norte da Tan­zânia, e da marca de água en­gar­ra­fada Ki­li­man­jaro, a mais ven­dida no país. Já a IPP Re­sources, do mesmo grupo, é pro­pri­e­tária de minas de ouro, urânio, cobre, crómio e carvão.

Um úl­timo exemplo ilustra como «a glo­ba­li­zação dos media no con­ti­nente afri­cano se en­contra num mo­mento de di­na­mismo cres­cente e como as suas prá­ticas estão li­gadas aos pro­cessos glo­bais ca­pi­ta­listas». Na Ni­géria, a maior eco­nomia de África, o con­glo­me­rado mais im­por­tante é o Daar Com­mu­ni­ca­tions PLC, pi­o­neiro da te­le­visão por sa­té­lite, em 1996, a African In­de­pen­dent Te­le­vison (AIT). Lançou de­pois o sinal nos Es­tados Unidos, no Mé­xico, no Ca­ribe e em toda a Eu­ropa. O seu pre­si­dente, Ray­mond Dok­pesi, di­rige igual­mente um con­sórcio de bancos li­de­rado pelo Union Bank Plc, de ca­pital mai­o­ri­ta­ri­a­mente in­glês.

Com tal si­tu­ação, não sur­pre­ende que Se­bas­tián Ruiz con­firme que a África «está inun­dada pelo con­teúdo dos meios de co­mu­ni­cação de massas e, com ele, a fi­lo­sofía, va­lores e di­fe­rentes vi­sões do mundo, so­bre­tudo dos Es­tados Unidos». Ele re­lembra que, no co­ração do Im­pério, cinco grandes cor­po­ra­ções, li­gadas às elites po­lí­ticas e eco­nó­micas (Time Warner, Disney, News Cor­po­ra­tion, Ber­tels­mann e Vi­acom), con­trolam 90 por cento dos meios de co­mu­ni­cação. E que as suas ra­mi­fi­ca­ções chegam a todo o mundo. À África também.

 



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